Em 2000 começou tímido no
Parque Nacional da Floresta da Tijuca um projeto de
erradicação de espécies exóticas. Seu alvo principal era as
jaqueiras que estavam se multiplicando em uma velocidade
espantosa, tornando-se invasoras e roubando espaço a plantas
nativas do Rio de Janeiro.
Poucos freqüentadores da
Floresta sabem que, embora tenha esse jeitão tão brasileiro, a
jaqueira é uma espécie originária da Ásia. Chegou ao Brasil
nas caravelas portuguesas que navegavam entre os portos do
Atlântico e as colônias de Timor, Goa e Macau. Aqui plantada,
não teve dificuldade em aclimatar-se no calor úmido e fez da
Mata Atlântica sua casa.
Com efeito, adaptou-se tão
bem que logo começou a espalhar-se sozinha não mais carecendo
de jardineiro para plantá-la nem regá-la. A própria jaca
madura ao cair no chão se espatifa, espalhando pelo solo
incontáveis sementes que, a seu turno, germinam
transformando-se em novas árvores. Por outro lado, quatis,
esquilos e macacos atuam como agentes dispersores, carregando
outras sementes a locais mais afastados. Nesse processo, o
jaqueiral avança, roubando espaço à floresta nativa da
Guanabara. Hoje, no Parque Nacional, várias áreas já têm
aparência de monucultura de jacas.
Ainda assim, devo
confessar que, a princípio, tive minhas dúvidas sobre o
projeto. Afinal, em um Parque cujo decreto de criação comemora
o centenário de um hercúleo esforço de reflorestamento, o que
é nativo? A Mata Atlântica ou as espécies plantadas pelo Major
Archer e seus seis escravos? Fora isso, tinha minhas dúvidas
sobre as conseqüências da supressão de uma espécie frutífera
para a dieta da fauna.
O projeto, entretanto tem
estofo. Seus idealizadores, os engenheiros florestais Luiz
Fernando Lopes e Henrique Guerreiro, sabem o que estão
fazendo. O problema não é a jaqueira em si, mas sua
multiplicação descontrolada em detrimento da Mata Atlântica.
Para estancar esse cresimento desordenado começaram,
então, a anelar algumas jaqueiras asfixiando-as até provocar
sua morte. Até aí tudo bem. A história dos dois não é nova –já
foi noticiada inclusive aqui em O Eco - nem é singular.
Programas para erradicação de espécies exóticas são comuns no
mundo inteiro. Para citar apenas exemplos de parques nacionais
urbanos, cuja realidade é similar à da Tijuca, há processos do
gênero sendo executados em Sydney e na Cidade do Cabo.
Na maior cidade da Oceania, o cervo rusa, natural da
Ilha de Java, introduzido há mais de cem anos no Royal
National Park, está sendo abatido a tiros. No extremo
oposto de Sydney, na áreas naturais do subúrbio de Wilhoughby,
todos os dias grupos de voluntários se reúnem com enxadas,
foices, tesourões e ancinhos. Passam horas removendo espécies
exóticas da vegetação dos Parques e Reservas de sua
vizinhança. O objetivo é retorná-los ao seu estado nativo
primitivo, apenas com espécies australianas.
Já no
Parque Nacional da Montanha da Mesa, na Cidade do Cabo, as
florestas de eucalipto e pinheiro estão sendo postas abaixo
por um grande programa de erradição de exóticas. Seu objetivo
é substituir essas árvores oriundas da Europa e da Austrália
pela vegetação floral conhecida como fynbos, nativa da área e
ameaçada de extinção.
Tanto na Austrália, quanto na
África do Sul, há oposição às medidas. Os sul-africanos estão
bem organizados e contam até com uma página na
internet.
Também na internet começou a oposição ao
projeto Guerreiro de Lópes. Uma senhora mais do que bem
intencionada- pois pensa a causa ambiental com o coração-
começou a reclamar do anelamento em algumas comunidades do
Orkurt dedicadas à Floresta. Suas preocupações, sempre pela
internet, foram logo explicadas pela dupla de engenheiros.
Lopes e Guerreiro responderam explanando o mal que as exóticas
fazem a um Parque Nacional e contando os objetivos do projeto
sob sua batuta. Entre os argumentos que elencaram, explicaram
que estão plantando árvores frutíferas da Mata Atlântica para
substituir o vácuo deixado pelas jacas e garantindo assim
fonte permanente de alimentação para os micos, quatis e outros
animais que hoje fazem da fruta asiática parte de sua dieta
regular.
Foram educados e claros. Estão fazendo aquilo
que a sociedade os paga para fazer: manejo. Não convenceram. A
senhora manteve-se firme no propósito de impedir que o Parque
Nacional da Floresta da Tijuca seja manejado como pede a
legislação em vigor e apresentou denúncia na Polícia Federal,
logo seguida de uma ação civil pública. Até que sejam apurados
os fatos pelas autoridades competentes, a senhora conseguiu
seu objetivo: desviou os engenheiros florestais do mato, onde
realizavam trabalho digno de nota, para uma mesa de escritório
onde têm gastado algumas horas preparando sua defesa.
É pena, mas não há de ser nada. A ação civil, ainda
que retarde o trabalho na Floresta da Tijuca, tem o mérito de
colocar o tema em discussão e mostrar ao grande público a
importância da eliminação de espécies exóticas em Parques
Nacionais. O resto é histericologia.